Fora da Igreja há Salvação?
"Fora da Igreja não há Salvação". Esta frase, proclamada pelo IV Concílio de Latrão no ano de 1213, tem gerado polêmicas em torno da cristandade ao longo dos séculos. Existe salvação fora da Igreja?
Na verdade não estou escrevendo (nem lendo) ultimamente sobre assuntos teológicos. Apesar disto, decidi dispensar alguns minutos para colocar no papel (ou no meu blog, já que não estou escrevendo à caneta) algumas reflexões que tenho acerca desta polêmica.
Apesar de ter dito que a frase "Fora da Igreja não há Salvação" foi proferida no século XIII [retirei esta informação deste link], existem registros que ela havia sido proferida muito antes, nos primórdios do cristianismo, no século III, por um bispo cristão da cidade de Cartago, chamado Cipriano. Outros afirmam que foi Atanásio (séc. IV) quem proferiu esta frase pela primeira vez.
Independente de quem tenha sido o cristão progenitor desta frase, a verdade é que o conceito por trás do "fora da Igreja não há salvação" é mais antigo que o próprio Jesus, não sendo, assim, uma exclusividade do Cristianismo.
Podemos enxergar, ao lermos o Velho Testamento, que o povo hebreu acreditava convictamente que Yaweh (nome hebraico para Jeová) era Senhor APENAS do povo de Israel. Vemos claramente nos registros bíblicos que os hebreus consideravam as nações vizinhas não apenas como inimigas de Israel, mas como inimigas do próprio Deus.
Após a nação de Israel se dividir em duas (Israel e Judá), os habitantes destas duas nações distintas começaram a intrigar entre si sobre qual delas levava o título de "verdadeira nação de Deus". As tribos do norte (que continuaram a ser chamadas de Israel) desconsideravam as tribos do sul como sendo povo de Deus, consideravam-nas inimigas; Já as tribos do sul (que passaram a ser chamadas de Judá) consideravam as tribos do norte como inimigas e que somente elas, as tribos do sul, eram povo de Deus.
Judeus odiavam samaritanos e vice e versa.
Onde se deveria adorar a Deus de verdade? Em Samaria (capital de Israel) ou em Jerusalém (capital de Judá)? Esta foi a pergunta feita por uma samaritana a Jesus.
Apenas abrindo um parêntese no curso deste artigo: a narração deste acontecimento em Jo 4 mostra o quanto as duas nações eram exclusivistas em relação a Deus. Após Jesus pedir água à samaritana, ela, assustada, lhe perguntou: "Como o senhor, sendo judeu, pede a mim, uma samaritana, água para beber?" (Jo 4:9)
Pois bem. Jesus quebrou todos os paradigmas de que Deus era exclusivo de apenas um povo.
Jesus morreu.
Alguns anos depois os seguidores de Jesus fundaram o Cristianismo. Alguma coisa mudou em relação a esse assunto?
Não.
"Apenas quem for cristão será salvo", "aceite Jesus ou você vai pro Inferno" ou "Fora da Igreja não há Salvação".
Bem, séculos depois (século XXI) aconteceu a primeira divisão (por motivos fúteis) entre os cristãos: a Igreja Católica Romana segue um rumo e a Igreja Ortodoxa Oriental segue outro. Negligenciando o exemplo de Cristo ("os adoradores de Deus o adoram em Espírito e em Verdade") e seguindo o mal exemplo de Israel e Judá ("Deus é nosso e você que pensa diferente vai pro quinto dos infernos") ambos começaram a discutir sobre qual facção do cristianismo possuía o "selo" de Deus.
Para os católicos romanos, os ortodoxos orientais são apenas hereges cismáticos; para os ortodoxos, os católicos são qualquer coisa, menos povo de Deus.
Pois bem, avançando um pouco na história, um monge agostiniano chamado Martinho Lutero (em 1517) se revoltou contra algumas práticas e posições da Igreja Católica Romana e causou outra divisão entre os cristãos, evento chamado de "Reforma Protestante".
Desta forma, os católicos passaram a considerar os "protestantes" como filhos do Diabo e, em contrapartida, os protestantes consideram os católicos apenas idólatras que vão queimar no inferno.
Seguindo mais um pouco na história, os protestantes se dividiram incontáveis vezes, surgindo o que hoje conhecemos como "batistas", "presbiterianos", "anglicanos", "luteranos", "metodistas", "assembleianos", "quadrangulares", "maranatas", etc, etc, etc, e muito mais etc.
Muitas destas denominações acusam as demais denominações protestantes de inúmeros nomes pejorativos e, claro, não os consideram como filhos de Deus.
Paralela a toda esta história das divisões no meio cristão, inúmeros movimentos religiosos surgiram em todo o mundo (o maior deles, o Islã). Todos (ou quase todos) afirmam ser a única religião verdadeira e condenam as demais religiões como falsas.
Sobre estas outras religiões me abstenho de falar, pois não as conheço (exceto o Islã, sobre a qual já estudei alguns aspectos). Já sobre o cristianismo, sendo cristão, acredito que sou apto a tecer algumas considerações.
A primeira delas é que não há margem na Bíblia para desconsiderar as religiões das outras pessoas como falsas e heréticas e ainda julgar os adeptos destas religiões como pessoas condenadas ao inferno. Digo isso com propriedade, afinal Jesus - o exemplo a ser seguido - jamais falou mal de qualquer religião gentílica de sua época.
A segunda consideração é que temos muito trabalho a fazer para nos darmos ao luxo de ficar perdendo tempo procurando erros nas religiões dos outros. O tempo (e o dinheiro) que são gastos com programas de televisão em rede nacional para falar mal de outras religiões podiam ser usados sustentando missionários que estão passando dificuldades em lugares longínquos neste planeta. Como já disse, Jesus não perdeu tempo tecendo comentários sobre outras religiões (aliás, a única religião da qual Jesus falou negativamente foi a que ele seguia, criticando os líderes hipócritas do judaísmo). Jesus usou o tempo que tinha para fazer o seu trabalho, apenas.
E a questão proposta no início do texto: existe salvação fora da Igreja?
Se há ou não é impossível sabermos, afinal, Jesus nem a Bíblia nada disseram sobre esta questão. O que a Bíblia diz é que o julgamento sobre quem será e quem não será salvo vai acontecer apenas após este mundo acabar e será realizado por Deus. Portanto, acho insensato fazermos julgamentos sobre os outros, como os cristãos (católicos e evangélicos) adoram fazer.
Para terminar, gostaria de convidar a todos a refletir no texto do capítulo 10 do livro de Atos. A passagem trás a história de um homem chamado Cornélio que não era judeu, não era cristão, não possuía religião e era, segundo a Bíblia, um homem temente a Deus. A Bíblia ainda diz que Deus se agradava de Cornélio, mesmo ele não sendo nem judeu nem cristão.
Na verdade não estou escrevendo (nem lendo) ultimamente sobre assuntos teológicos. Apesar disto, decidi dispensar alguns minutos para colocar no papel (ou no meu blog, já que não estou escrevendo à caneta) algumas reflexões que tenho acerca desta polêmica.
Apesar de ter dito que a frase "Fora da Igreja não há Salvação" foi proferida no século XIII [retirei esta informação deste link], existem registros que ela havia sido proferida muito antes, nos primórdios do cristianismo, no século III, por um bispo cristão da cidade de Cartago, chamado Cipriano. Outros afirmam que foi Atanásio (séc. IV) quem proferiu esta frase pela primeira vez.
Independente de quem tenha sido o cristão progenitor desta frase, a verdade é que o conceito por trás do "fora da Igreja não há salvação" é mais antigo que o próprio Jesus, não sendo, assim, uma exclusividade do Cristianismo.
Podemos enxergar, ao lermos o Velho Testamento, que o povo hebreu acreditava convictamente que Yaweh (nome hebraico para Jeová) era Senhor APENAS do povo de Israel. Vemos claramente nos registros bíblicos que os hebreus consideravam as nações vizinhas não apenas como inimigas de Israel, mas como inimigas do próprio Deus.
Após a nação de Israel se dividir em duas (Israel e Judá), os habitantes destas duas nações distintas começaram a intrigar entre si sobre qual delas levava o título de "verdadeira nação de Deus". As tribos do norte (que continuaram a ser chamadas de Israel) desconsideravam as tribos do sul como sendo povo de Deus, consideravam-nas inimigas; Já as tribos do sul (que passaram a ser chamadas de Judá) consideravam as tribos do norte como inimigas e que somente elas, as tribos do sul, eram povo de Deus.
Judeus odiavam samaritanos e vice e versa.
Onde se deveria adorar a Deus de verdade? Em Samaria (capital de Israel) ou em Jerusalém (capital de Judá)? Esta foi a pergunta feita por uma samaritana a Jesus.
Apenas abrindo um parêntese no curso deste artigo: a narração deste acontecimento em Jo 4 mostra o quanto as duas nações eram exclusivistas em relação a Deus. Após Jesus pedir água à samaritana, ela, assustada, lhe perguntou: "Como o senhor, sendo judeu, pede a mim, uma samaritana, água para beber?" (Jo 4:9)
Pois bem. Jesus quebrou todos os paradigmas de que Deus era exclusivo de apenas um povo.
Jesus morreu.
Alguns anos depois os seguidores de Jesus fundaram o Cristianismo. Alguma coisa mudou em relação a esse assunto?
Não.
"Apenas quem for cristão será salvo", "aceite Jesus ou você vai pro Inferno" ou "Fora da Igreja não há Salvação".
Bem, séculos depois (século XXI) aconteceu a primeira divisão (por motivos fúteis) entre os cristãos: a Igreja Católica Romana segue um rumo e a Igreja Ortodoxa Oriental segue outro. Negligenciando o exemplo de Cristo ("os adoradores de Deus o adoram em Espírito e em Verdade") e seguindo o mal exemplo de Israel e Judá ("Deus é nosso e você que pensa diferente vai pro quinto dos infernos") ambos começaram a discutir sobre qual facção do cristianismo possuía o "selo" de Deus.
Para os católicos romanos, os ortodoxos orientais são apenas hereges cismáticos; para os ortodoxos, os católicos são qualquer coisa, menos povo de Deus.
Pois bem, avançando um pouco na história, um monge agostiniano chamado Martinho Lutero (em 1517) se revoltou contra algumas práticas e posições da Igreja Católica Romana e causou outra divisão entre os cristãos, evento chamado de "Reforma Protestante".
Desta forma, os católicos passaram a considerar os "protestantes" como filhos do Diabo e, em contrapartida, os protestantes consideram os católicos apenas idólatras que vão queimar no inferno.
Seguindo mais um pouco na história, os protestantes se dividiram incontáveis vezes, surgindo o que hoje conhecemos como "batistas", "presbiterianos", "anglicanos", "luteranos", "metodistas", "assembleianos", "quadrangulares", "maranatas", etc, etc, etc, e muito mais etc.
Muitas destas denominações acusam as demais denominações protestantes de inúmeros nomes pejorativos e, claro, não os consideram como filhos de Deus.
Paralela a toda esta história das divisões no meio cristão, inúmeros movimentos religiosos surgiram em todo o mundo (o maior deles, o Islã). Todos (ou quase todos) afirmam ser a única religião verdadeira e condenam as demais religiões como falsas.
Sobre estas outras religiões me abstenho de falar, pois não as conheço (exceto o Islã, sobre a qual já estudei alguns aspectos). Já sobre o cristianismo, sendo cristão, acredito que sou apto a tecer algumas considerações.
A primeira delas é que não há margem na Bíblia para desconsiderar as religiões das outras pessoas como falsas e heréticas e ainda julgar os adeptos destas religiões como pessoas condenadas ao inferno. Digo isso com propriedade, afinal Jesus - o exemplo a ser seguido - jamais falou mal de qualquer religião gentílica de sua época.
A segunda consideração é que temos muito trabalho a fazer para nos darmos ao luxo de ficar perdendo tempo procurando erros nas religiões dos outros. O tempo (e o dinheiro) que são gastos com programas de televisão em rede nacional para falar mal de outras religiões podiam ser usados sustentando missionários que estão passando dificuldades em lugares longínquos neste planeta. Como já disse, Jesus não perdeu tempo tecendo comentários sobre outras religiões (aliás, a única religião da qual Jesus falou negativamente foi a que ele seguia, criticando os líderes hipócritas do judaísmo). Jesus usou o tempo que tinha para fazer o seu trabalho, apenas.
E a questão proposta no início do texto: existe salvação fora da Igreja?
Se há ou não é impossível sabermos, afinal, Jesus nem a Bíblia nada disseram sobre esta questão. O que a Bíblia diz é que o julgamento sobre quem será e quem não será salvo vai acontecer apenas após este mundo acabar e será realizado por Deus. Portanto, acho insensato fazermos julgamentos sobre os outros, como os cristãos (católicos e evangélicos) adoram fazer.
Para terminar, gostaria de convidar a todos a refletir no texto do capítulo 10 do livro de Atos. A passagem trás a história de um homem chamado Cornélio que não era judeu, não era cristão, não possuía religião e era, segundo a Bíblia, um homem temente a Deus. A Bíblia ainda diz que Deus se agradava de Cornélio, mesmo ele não sendo nem judeu nem cristão.
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