Arrependimento pode gerar mudanças de verdade?
Recentemente uma delegacia em Minas Gerais foi surpreendida por um fato inédito. Um rapaz se apresentou para devolver um celular que havia furtado. Ele resolveu devolver justamente na virada do ano, pois, “sabe como é ano novo, decidi levar uma vida nova” – disse o ladrão arrependido. Esta notícia deveria nos dar um novo fôlego de ânimo na capacidade do ser humano de mudar. Infelizmente, dois meses depois o rapaz foi preso novamente por furtar outro celular em um ônibus na região. Ao ser preso e questionado, disse que realmente tentou mudar, mas que, como estava apertado e sem dinheiro, “tive de fazer isso”.
Histórias assim são tristemente comuns. Em maior ou menor escala, quem de nós já não passou por uma experiência assim? Nos damos conta de que um comportamento nosso é destrutivo e ruim para nós, para os outros e é ofensivo a Deus. Nos arrependemos, prometemos (às vezes publicamente), e nossa decisão dura algum tempo. Mas as circunstâncias que favoreceram nosso pecado voltam a surgir e voltamos a praticá-lo, não raramente em uma escala maior ou mais intensa que anteriormente.
Remorso trata-se de uma tristeza profunda pelos efeitos de nossos atos, arrependimento é uma tristeza profunda pelos atos em si. Remorso é administrar consequências, arrependimento é abandonar um comportamento e estabelecer um novo modo de agir.
Existe arrependimento verdadeiro? Pessoas realmente mudam de comportamento? O que é um arrependimento verdadeiro? Estas perguntas são fundamentais para nossa vida e para ajudarmos pessoas que querem mudar, que desejam abandonar um comportamento ou uma prática que reconhecem ser destrutiva.
É fundamental diferenciarmos arrependimento de remorso. Apesar de uma aparência externa muito semelhante, às vezes impossível de distinguir, estas duas posturas são profundamente diferentes. Remorso trata-se de uma tristeza profunda pelos efeitos de nossos atos, arrependimento é uma tristeza profunda pelos atos em si. Remorso é administrar consequências, arrependimento é abandonar um comportamento e estabelecer um novo modo de agir. Em seu longo relacionamento com a difícil igreja de Corinto, o apóstolo Paulo trata diretamente deste tema. Após enviar uma carta bastante dura e ficar sabendo que os cristãos daquela cidade haviam se entristecido, ele afirma:
9Agora, porém, me alegro, não porque vocês foram entristecidos, mas porque a tristeza os levou ao arrependimento. Pois vocês se entristeceram como Deus desejava e de forma alguma foram prejudicados por nossa causa. 10A tristeza segundo Deus não produz remorso, mas sim um arrependimento que leva à salvação, e a tristeza segundo o mundo produz morte. 11Vejam o que esta tristeza segundo Deus produziu em vocês: que dedicação, que desculpas, que indignação, que temor, que saudade, que preocupação, que desejo de ver a justiça feita! Em tudo vocês se mostraram inocentes a esse respeito. (2Coríntios 7.9-11)
No verso 9, o apóstolo afirma que não se alegrou com a tristeza, mas com o arrependimento. Infelizmente não é possível um sem o outro. Em nossos relacionamentos cristãos haverá momentos em que vamos gerar tristeza na pessoa que amamos. Apesar desta realidade também ser dolorosa para nós, há tristezas que geram arrependimento e isso é motivo de grande alegria!
Tanto arrependimento como remorso são fruto da tristeza. No entanto, arrependimento é fruto de uma tristeza segundo Deus e remorso resulta de uma tristeza segundo o mundo. Em minha experiência não é possível distinguir que tipo de tristeza se trata no momento em que esta é expressa. Lágrimas tem um alto poder de convencimento, mas não são uma prova de que a tristeza expressa vem de Deus, nem tampouco sua ausência significa que a tristeza é do mundo.
Os resultados de arrependimento são diametralmente opostos: arrependimento leva à salvação, remorso leva à morte (vide o remorso de Judas em Mateus 27.3-5). É possível, portanto, alguém ficar sinceramente triste com seu erro, mas tudo isso não passar de remorso. A origem da palavra remorso significa “voltar a morder”. É uma ilustração excelente desta tristeza que dói, mas não gera liberdade; continua “mordendo”, doendo, mas sem solução. Remorso gera morte pois escraviza e não aponta solução. Ou a pessoa aceita este seu comportamento como imutável ou ela apela para fugir da própria vida, como fez Judas.
Já o arrependimento gera uma série de resultados positivos. O principal deles é a própria mudança de vida. No verso 11 Paulo descreve os frutos do arrependimento:
- Dedicação – no arrependimento, a pessoa leva o que aconteceu muito a sério; não é apenas um deslize, é algo a ser tratado com dedicação, com atenção e levado às últimas consequências.
- Desculpas – um passo claro do arrependimento é o pedido de perdão. Não apenas um sinto muito, ou “deixa pra lá”, mas um ato de restituição relacional no qual o arrependido reconhece seu pecado e pede aos atingidos que o perdoem.
- Indignação – uma das expressões do arrependimento é uma condenação clara ao ato cometido. Não há aqui espaço para justificativas, não há espaço para explicações. A pessoas arrependida fica indignada com seu próprio erro e o vê como algo inaceitável.
- Temor – aquele que se arrepende se dá conta de como seu comportamento ofende a Deus em primeiro lugar. E é este temor que o move a mudar seu padrão de vida.
- Saudade – o temor “saudade” reflete o desejo de quem se arrepende de retomar um relacionamento que havia antes do pecado.
- Preocupação – no arrependimento há um desejo intenso de “acertar as contas”. Assim como a reconciliação, o pecado e a restituição são desejos ardentes, são temas centrais no coração do arrependido.
- Desejo de ver a justiça ser feita – Por fim, o arrependido deseja fazer restituição. Mesmo sabendo que com frequência não há como repor ou compensar a ofensa feita, o arrependido deseja que a justiça seja feita. Ele ou ela aceitam os passos que forem necessários para assumir seu erro.
Como está seu coração com relação aos erros que tem cometido? Como é sua tristeza ao se dar conta de um pecado. Você se arrepende ou sente remorso? Minha oração por você e por mim mesmo é que nosso coração esteja sempre pronto a um arrependimento verdadeiro. Como afirmou o autor Wyatt Graham: “Toda nossa vida deve ser marcada por confiança e arrependimento!”.[1]